Encontra-se em andamento o programa “Ciência sem fronteiras”, com meta de capacitar em educação de alta qualidade 75.000 acadêmicos no prazo de quatro anos (http://www.mct.gov.br/upd_blob/0217/217221.pdf). As áreas prioritárias para o programa são as de natureza técnica, entre elas engenharia, computação e sistemas de informação.
Não restam dúvidas sobre a importância do programa na medida em que seu objetivo centra-se no incremento do desenvolvimento econômico baseado na tecnologia, na inovação e na competitividade. Mas algumas críticas mais abrangentes sobre a política educacional brasileira podem e merecem ser tecidas.
Antes, porém, é necessário a explicitação da expressão "qualidade da educação". De acordo com a Unesco (The Quality Imperative – http://www.unesco.org/education/gmr_download/en_summary.pdf), dois princípios definem o que seja qualidade em educação.
Um deles se refere ao desenvolvimento das capacidades cognitivas como dado objetivo (mensurável) em todos os níveis do sistema educacional. Capacidade cognitiva envolve a representação adequada do que seja o mundo expressa nas identificação e interrelação de seus fenômenos.
O outro princípio enfatiza o papel da educação na promoção de valores e atitudes na realização da cidadania, do potencial criativo e do equilíbrio emocional.
Para que a qualidade em educação seja concreta, alguns pre-requisitos se apresentam, com o primeito deles centrado na educação e cuidados na infância. A ausência de cuidados aumenta as possibilidades de exclusão social e econômica das crianças que não tiveram oportunidades de frequentar programas adequados.
Aqui se insere a crítica antes mencionada: “Ciência sem fronteiras” foca a educação, primariamente, como compromisso econômico em detrimento do social. Aumento de oportunidades econômicas não é sinônimo de melhoria nos padrões de bem-estar sociais das comunidades (o seguinte endereço contém exemplos ilustrativos: http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0892/noticias/veja-como-as-cidades-brasileiras-investem-os-royalties-do-petroleo-m0128066).
A maneira adequada encontra-se em abordagens que privilegiem o equilíbrio econômico-social das metas educacionais. Conjuntamente com a realização do programa, deveriam ser feitos expressivos investimentos na implementação de creches de qualidade e nos ensinos fundamental e básico.
Considerado direito básico pela Constituição de 1988 (art. 7°, XXV; art. 208, IV), o total de matriculados em creches no Brasil atinge menos de 17% das crianças na faixa etária 0 - 3 anos de idade (estudo abrangente encontra-se no endereço http://www.todospelaeducacao.org.br/comunicacao-e-midia/noticias/12891/brasil-deve-triplicar-numero-de-matriculas-em-creches-para-atingir-meta-do-pne).
Sem preocupações com os estágios fundamentais de formação dos futuros participantes, programas como o “Ciência sem fronteiras” parecem depender, basicamente:
1) da sorte social, no caso do participante pertencer aos níveis economicamente menos favorecidos da sociedade, pois a ocorrência das condições adequadas para seu desenvolvimento intelectual é contingente; ou
2) de o participante provir das camadas economicamente aptas a propiciarem educação adequada aos seus membros.